sexta-feira, 23 de abril de 2010

Show de lançamento do CD Lua Caiada, de Nelson Coelho de Castro



O compositor Nelson Coelho de Castro se apresenta no Salão de Atos da UFRGS, no próximo dia 7 de maio, para o lançamento do CD LUA CAIADA, contemplado pelo Programa Petrobras Cultural.

Este seu novo trabalho mostra um compositor que chega à maturidade autoral revelando, mais uma vez, sua relação afetiva com a MPB. No repertório do disco vamos encontrar sambas, ciranda, samba de roda, valsa brasileira, entre outros gêneros, com arranjos sofisticados e a poética genuína de Nelson.


Músicas e Músicos

No roteiro do show vão estar a quase totalidade das canções do CD, assim como alguns dos seus maiores sucessos como Armadilha, Ver-te/Algo Teu, No Braço com a Vida e Pérola no Veludo.

Os músicos da banda serão os mesmos que participaram das gravações do CD: Giovani Berti e Fernando do Ó, percussão; Mario Carvalho, baixo; Michel Dorfman, piano; Edilson Ávila, guitarra e violão; Pedrinho Franco, violão 7 cordas, cavaquinho e bandolim; João Carlos Charão, trombone; Luizinho Santos, flauta e sax e Alexandre Rosa, clarinete.

Monica Tomasi é a convidada especial. Ela também faz parte do disco, gravando, em grande estilo, o samba Apela ao lado de Nelson.


História

Em abril de 1979 o Salão de Atos da UFRGS estava repleto para assistir ao lançamento do primeiro disco de Nelson Coelho de Castro, o compacto “Faz a Cabeça”. Em 1981, esta cena se repete no mesmo local quando Nelson fez o show de lançamento do seu primeiro LP – “Juntos”. Histórico momento. “Juntos” era também o primeiro disco independente feito no Rio Grande do Sul. Em 1985, mais uma vez Nelson volta ao Salão de Atos para apresentar o disco “Força D’Água”.

Exatos 31 anos depois Nelson retorna ao Salão de Atos para lançar seu novo disco.

Lua Caiada terá shows de lançamento em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte no mês de julho deste ano.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Nelson Coelho de Castro fala sobre as canções de Lua Caiada




Na segunda parte da entrevista realizada com Nelson Coelho de Castro, ele fala sobre cada uma das 17 canções presentes no CD Lua Caiada:

Menino Não Sobe a Rua
"Conta a história de um sambista da antiga que tenta, em vão, advertir a um novato sobre a escolha entre o prazer e o sofrimento. Na realidade, receia que a história deste vá se repetir na do garoto que está prestes a entrar numa roda de samba (“eles vão te enfeitiçar”).
Antes, cheguei a pensar que, só para importunar, poderia ser também uma sacana advertência de um sambista para aqueles arredios e fóbicos ao samba, pois que se estes fossem ao batuque, de lá jamais voltariam (“quando o samba começa, meu nego, não dá para escapar”). Desisti. Era só uma história de pai pra filho.
Pedi ao Pedrinho Franco que realçasse na introdução do samba o acorde G7(13) no violão. Era para criar uma atmosfera de apreensão. Só depois, escutando bem, vi uns longes das quatro notas que abrem a quinta sinfonia do Beethoven: tan tan tan tan! São as batidas da sinistra na porta. Que coisa. Botei, sem querer, o Beethoven num samba. Entre outras performances, o trombone do Charão é o que é de arrepiar."

Samba Machucado
"Aqui, um passista de uma escola de samba fica cônscio de culpa, num arrependimento sem fim, se entrega ao desolamento. Ao avesso da maravilhosa “Atire a primeira pedra” - de Ataulfo Alves e Mário Lago, o passista, depois de desgostar seu amor - abdica até de pedir perdão.
Outra referência, que só fui observar bem agora quando o disco chegou, está nos verbos “machucar” e “desmonorar”. Eles constam na letra do samba “Pra Machucar Meu Coração” do Ari Barroso. Longe de qualquer insinuação de parentesco, fiquei apenas basbaque de feliz. Se topasse antes com isso, estaria no encarte do CD, como fiz com algumas outras músicas.
O pandeiro “sacana” de Giovani Berti, além de serenar a consternação do personagem, não deixa o samba ficar tão machucado assim, já que o “passista perdeu seu carnaval”. "

Dia da Festa
"Foi prazer cabal. A concepção rítmica que o Giovani Berti criou com Fernando do Ó para o cajón (aliás, dois, gravados simultaneamente) gerou um colóquio retumbante entre as madeiras. Os pulsos se provocam, revidam acentos e meandros candentes.
A letra conta uma história, sem borda, sobre personagens dum mínimo cafundó brasileiro no dia do seu aguardado folguedo principal. Um é dócil, outro sestroso, outro estrangeiro, outro escuta. A mulher bole com todos, como teria que ser. A festa, além sacralização do desejo, é a única salvação para os idílios do lugar.
A melodia que avança, recebe o sax sinuoso de Luizinho Santos na segunda parte. O piano, o baixo e os violões cultivam, junto da percussão, a tensão da história. Ao final, Edilson Ávila vai bordando frases de guitarra ao seu bel prazer."

Apela
"Este samba eu vinha fazendo sem açodamento. No início, brincava com os significados dos verbos “apelar” e “chamar” em português e francês. No show “Pérola no Veludo”, a Monica Tomasi solava no cavaquinho a melodia da segunda parte, pois carecia da letra.
O tema é mais do gênero impossível: o arrependimento surge quando não há mais o que fazer. O livramento solicitado, enfim, é o acaso que se encarrega: “Agora vá cuidar dos seus desalinhos, foi se enredar em outro destino”.
Um samba catimbado, cheio de síncopes. Convidei especialmente a Monica Tomasi para cantar a faixa comigo. Ela está muito bonita, como sempre, mandando ver em simpatia e doçura. "

Mulato Carmim
"Quando comecei a compor Mulato Carmim, me dei conta de uma grata recorrência. Foi a personagem de um sambista, que havia protagonizado os meus sambas Ele Vem de Manhã e Rapaz, do disco Verniz da Madrugada, de 1996, se querendo ali. Eu lhe disse: tá bem e logo me veio à cachola a idéia de fechar uma trilogia sobre o improvável homem cordial brasileiro, incensado ao delírio nestes referidos sambas. Para não ser tão onírico, traços verídicos desta persona encontro seguido por aí. Generoso e doido de estima, ele existe e existem tantos. Basta identificá-los. Eles têm a tarefa de equilibrar este nosso tempo: mesquinho e rude. Com “Mulato Carmim, então, encerraria a coisa. Mas, desta vez, o personagem, autônomo, foi além. Explico.
No repertório dos meus discos, quase sempre, havia uma canção mais contundente. Umas das últimas deste naipe foi Cachorro Chinês, que está no disco Da Pessoa, de 2001. Um catatau de versos abarrotados de flashes sobre a insana condição humana. Depois dessa, eu achava que a veia belicosa estava lá, em vacância, quieta no seu canto. Mesmo querendo revidar alguma tapa da realidade, nada existia deste cunho nas canções escolhidas para o novo CD. Mas não é que, sei lá como, logo o Mulato Carmim foi se incumbir disso.
Enquanto a melodia do samba abre-se meiga - e vai deste modo até o seu fim - a letra começa a deitar felpas esmeriladas mirando o arrogante, o avaro, a inveja, o empatador, a afetação, o poder, e foi sobrar até para o domínio da estrutura da linguagem, do discurso, tanto da academia quanto de outros estamentos. Que coisa. Deixei e folguei. A canção, de feição incisiva, desta vez, veio acre-doce e na manha.
Além das citações do Hino Brasileiro (Maciço o preto no lábaro que ostenta estrelado) e de “Aquarela do Brasil”, Ary Barroso, (A merencória luz da lua, beija), há outra alusão que, mais prazerosa ainda, se veio, arrematadora, parar na letra. Está no verso “Mulato Carmim você passa e não carrega embrulho”. “Não carrega embrulho”, surrupiei, afetivamente, do admirável samba “A Banca do Distinto”, autoria de Billy Blanco. Para quem não sabe da história desta canção: a música foi feita para a cantora Dolores Duran, na época namorada de Billy. Dolores contou-lhe a história de um bacana que frequentava seus shows no Beco das Garrafas, no Rio de Janeiro. De costas para o palco, o patife bebia uísque no balcão e ordenava canções. Nunca apertava a mão de negros. Nem carregava a marmita. O garçom levava-lhe a embalagem até o carro. Depois de ouvir o perfil, Billy desfiou o samba num desagravo: "Não fala com pobre, não dá mão a preto - Não carrega embrulho- Pra que tanta pose, doutor - Pra que esse orgulho..." Serviu como uma luva.
Quando Fernando do Ó escutou a melodia, logo me disse: vou colocar um vibrafone neste samba. Aí e com isso, ele elducorou de vez o desenho dos tamborins, a melodia passada a limpo pelo piano do Michel Dorfman e o soar das vassouras na caixa."

Lua Caiada
"Pensei, mais uma vez, como “Dia da Festa”, num remoto lugarejo praiano. A lascívia noite brasileira, o sopro morno da orla, a lua como ornamento e signo, seu halo no oleado do mar, sobre as ruas de pedras e o povo dançando sob este éter.
Logo senti a recordação quando da primeira vez que entrei numa casa de chão batido. Eu tinha 11 anos. A casa era caiada e o piso era um grafite, tão esmeradamente varrido. O fogão à lenha, a chaleira areada, duas cadeiras de madeira com assentos de palha trançada, uma criança com febre, a mulher magra e triste, uma pequena mesa e muito mais viria nesta recordação, além do cheiro úmido da casa que ainda está em mim.
A melodia da gaita, em três vozes, que no fim da música se insere, é de bem antes, 1971. Lembro bem de saber que um dia eu iria usá-la. Como é que pode isto se dar quase 40 anos depois? Dois grandes amigos, Gustavo Finkler e sua companheira Renata Mattar se mandaram de São Paulo, especialmente para gravarem, respectivamente, a viola e a gaita. Tudo ficou candente."

Marinho
"O vinho não é muito minha praia. Mas fico admirado com aqueles que, ao sorverem a bebida, depois de fungarem educadamente a borda do cálice, passam a parir frases aromáticas: este possui um traço de almiscar, um travo de grama cortada, notas de cerejas e tabaco, longes de frutos negros... e assim vai, uma maravilha de poesia.
Para compor “Marinho”, consumido de pejo, fui colhendo, até onde minha ignorância pode ver e arrumar, uns longes da canção maresia de Dorival Caymmi, o mesmo longes da música do oceano Villa Lobos, quase nadinha do rizoma metafísico de Guimarães Rosa.
Quando comecei a melodia, vi que estava “baixando” o seu Villa. Quando veio o verso “Zé Calo não quis nem buli”, sentia o seu Dori se aproximando. Noutro verso, “soubesse o medo que tenho deste vasto (mar) que abisma sem precisão”, eu pensei pronto: agora chegou o seu Rosa. E assim fui com esses três, tremendo de medo.
Faço MPB por instinto e quando me dou conta que consigo ficar, ainda que a infinitas léguas, lindeiro de suas gemas e de seu arco, resta-me quedar entre apoucado e feliz. "

Cadê
"Quase 40 anos depois, voltei a morar perto do bairro onde me criei em Porto Alegre. Um dia resolvi e me fui ao pretérito. Entre outras referências que ainda restavam - comecei a notar as ausências indeléveis de um armazém que ficava na esquina de casa, a falta de um cinamomo, o campinho de areão transformado num monstro de 15 andares e, ainda espiando, levar um baque ao escutar meu nome na voz de um amigo de infância ainda morador dali.E tudo foi tão especialmente vivo e bateu forte a noção do “sem tempo”. Eu não estava ali em busca do tempo perdido, pois deste quase nada extraviei.
Existem, ao longo da história do cancioneiro brasileiro, mil músicas a partir desse tema da recordação. Mas em “Cadê”, embora com a letra dobrada em lembranças intactas, o mais prazeroso foi me descobrir com a ludicidade destes signos. Por estes e com estes, evidentemente, nos tornamos o que somos. Seria outro, se na casa de meu avô não morassem os mistérios que só um porão e um sótão sabem guardar ou esconder. A quase angústia na pergunta “cadê”, no título, todavia, já estava respondida desde sempre.
Portoalegrense, deitei citações da cidade: ora os nomes das ruas nas formas reduzidas, ora personagens como o Professor Brilhante e sua boina, desenhando sob as marquises da Igreja do Rosário. A descoberta da cidade, ainda como infanto, e meu anseio de pertencimento para com ela ainda vibram.
O clarinete de Alexandre Rosa mostra um fraseado contínuo, como a fábula do tempo e seu eterno retorno."

Clara
"Não dá para não observar numa pessoa que acaba de receber uma boa nova. E ela nem saberia, se quisesse, dissimular. Seus poros, em arrepio, a trairiam.
Um verso rezado que se vai numa escala de semitons descendo rio abaixo até chegar ao mar da constatação. Foi isso que vi no rosto da minha irmã, que não se chama Clara.
Exercito-me atento ao milagre do prosaico, do lhano, e no demasiado humano quando os olhos nos olhos se vão dando."

Teu Segredo
"Como disse no texto que fala sobre as letras, foi um ano antes de eu começar a gravar que mandei para o Bebeto Alves a melodia toda do “Teu Segredo”. Na mesma remessa, foram pedaços de versos e vários cacos de palavras. Ele, rápido e bondoso, logo montou a carpintaria.
Pretendia contar a velha história da moça que nega o amor que deveras sente pelo amado. Queria também que os versos fossem diretos, simples, com as rimas a partir do infinitivo dos verbos: estrelar, revelar, derramar, tudo pulsando de ardor, e na delicadeza, solicitando à paixão, a felicidade de “se deixar”...
No início era uma balada, mas pedi uma levada de samba para as congas e os vasos de cerâmica de Giovani Berti e do Fernando do Ó. Eles se puxaram mais uma vez.
Onde eu gravei havia dois estúdios. Uma tarde, quando colocava voz final nesta faixa, fui até a sala do café e escutei um músico, que não conhecia, ensaiando para outro disco. Ele executava uma peça difícil na gaita. Na volta, falei para o técnico Aguinaldo Paz: quem é aquele cara que tá lá no café tocando? É o Luizinho Correa, respondeu. Devolvi de pronto: será que ele toparia colocar umas frases nessa minha música? Deixa comigo, respondeu Aguina e foi saindo. Daqui a pouco chega o Luizinho, super sorridente, com a gaita ainda nos ombros. Eu tinha um contracanto para a segunda parte e ele gravou num único take. Meu Deus! Bom, eu disse: agora faça o que quiser que tá tudo maravilhoso! Uma sincronia daquelas."

Clau
"Pungente, esta melodia me tomou, assim no mais, quando eu via um filme na TV. Peguei o violão e “tirei” a música, nota por nota, ainda fresca, com medo de esquecer. Pensei encomendar um arranjo para um quarteto de cordas, mas não deu tempo e a grana do projeto já estava comprometida. Ainda penso fazer isso no futuro. Mas o piano do Michel Dorfman, mais uma vez, se encarregou lindamente disso.
Por pouco não levou o nome de “Sodade” ou “Primeira Sodade”. Virou Clau, pois a saudade era dela."

Esse Amor
"A melodia desta canção, como muita das outras, ficou sem letra durante uns três anos. Todo o dia ela surgia na cabeça e eu a assobiava em casa, na rua ou quando pegava o violão. Mesmo sem letra, cantava em alguns saraus. Uma perseguição das “buenas”.
Ficou na manha e solar, quase um samba bossa/canção. É uma doida declaração de amor, doida de não se atar, pois que não suporta mais sentir o desejo pulsar à demasia e o escancara em tripas e coração.
A frase que compus para a introdução pensava que soaria bem se fosse por um violão com cordas de aço. Aí, no estúdio, o Michel Dorfman me disse que tinha sido presenteado com uma escaleta novinha em folha...
O Mario Carvalho, primeiro gravou um baixo elétrico. Uma semana depois, chegou ele no estúdio, com uma cara de sem vergonha, tirou um cd da bolsa e me disse: gravei um baixo acústico em casa. Ficou demais. E ficou."

Ágora
"O Antonio Villeroy estava no estrangeiro, como dizia minha tia, acho que em Nova York, e de lá me envia um e-mail com versos cítricos, severos e poéticos. O escopo do parceiro era que começássemos, incitando-nos, a compor um novo repertório para o disco ou espetáculo “Juntos”, que reúne, além de nós dois, mais o Bebeto Alves e o Gelson Oliveira.
Na tela do computador, li os versos “somos homens bípedes com polegar aptos a... ...nossas vozes querem mais do que arranhar...” assim mesmo, sem mais nada, como se lançasse uma bola ao futuro. Ainda ali, sem perceber, fui desvelando a melodia que já estava soando pela métrica. Uma valsa.
Uma praça árida, ocre, sol a pino, a urbes, a espécie humana e o nada. Esse era o filme que me passava na cachola. Eu estava lendo alguma coisa de filosofia na época e a brincadeira com agora e ágora (praça) era o cenário/tempo para falar em nós, os “Juntos”, metidos nesta contemporaneidade maluca, neste “devir” maluco. Aconteceu do disco “Juntos” ser adiado, por conta dos projetos individuais dos quatro amigos. Mas a valsa estava lá comigo, quentinha. Quer saber: vou gravar.
O bandolim, ao esmero, do jovem Pedrinho Franco, sola a valsa inteira. É legítima a felicidade de escutá-lo."

Sábado de Manhã (para Mariana e Nicholas)
"Sábado de manhã, pra mim, é a concessão do vadiar, do ócio. No entanto, é um período circunscrito. Começa cedinho e vai, no máximo, até duas da tarde. Depois disso, na demasia da metáfora, já é domingo. Então, é neste âmbito de poucas horas que fico a perambular sem culpa por ruas que não conheço. Dobro ali, acolá, faço uma fezinha na loteca, e deixo-me, pelas onze, numa meia taça de café preto e um pastel. Se estiver com o Nicholas (meu filho de oito anos) vamos à pracinha, como ia com a irmã Mariana (que está com 22). E mais nem sei, por não saber mesmo.
O chorinho “Sábado de Manhã” veio neste clima. Proponho ou arrisco um convite: coloque esta faixa no tocador de Cd para “escutar” no seu próximo sábado de manhã, se possível, antes das 14hs."

No Cacho
"Fazendo a letra, lembrei do Lupi, que chamava seus amigos de “meu camaradinha”. Um diminutivo afetuoso, de estima sem par, inda mais naquela sua voz serena. Usei essa expressão e uma cena do samba canção “Quem há de dizer”, dele e do Alcides Gonçalves: “repare bem que quando ela fala, ilumina mais a sala do que a luz do refletor”. Em “No Cacho”, o mesmo sentido eu pretendi emprestar. O realce da moça possuída de esplendor, mistério e desejo. Já o personagem que fala, está morrendo de medo, na angústia de tirar ou não a moça pra dançar. Morreria no brejo, se não fosse, sob resgate derradeiro, salvo pela diva habitué da gafieira. Por pouco não batizo o samba de “Consolação”."

Clemente
“Eu vou na catega”. Quando um moleque, lá na minha rua, ao devolver um simples passe agregava algum ornamento - ou de calcanhar ou de letra – dizia-se que ele era cheio de “catega”.
O samba de roda baiano, samba chula, o samba de partido alto são a própria “catega” brasileira. "

Noite Vazou Encantada
"Este samba também faz parte do rol de músicas que ficaram sem letras por um bom período. Cantava nos shows, como disse noutro texto, mesmo sem ele estar pronto. Queria “experimentar” o refrão com a platéia. Muitas vezes, na manha, ela cantava comigo. Por isso, ao gravar, convidei um “bando” de amigos para fazer o coro do refrão. Foi emocionante ver, um por um deles, chegando no estúdio. Depois, ao fazerem um semi-círculo diante dos microfones e, mais ainda, quando mandaram ver: pura estima."

Entrevista com Nelson Coelho de Castro falando sobre seu novo CD, Lua Caiada


O compositor Nelson Coelho de Castro está lançando seu novo CD. Em entrevista ao Odara Blog, ele revela detalhes da produção deste novo trabalho, produzido com a chancela do Programa Petrobras Cultural e que está sendo lançado no próximo dia 7 de maio, em Porto Alegre, no Salão de Atos da UFRGS. Vamos aos principais trechos:

O primeiro LP continua:

"Com o lançamento deste CD, recupero uma emoção que se mantém ilesa. Lá no vinil - “Juntos”, de 1981, (meu primeiro disco) eu arrisquei descrever para aquele encarte uma singela reminiscência. O texto falava sobre as cores dos selos do LPs... cor de vinho, preto ou azul marinho. Depois, dos cantores e cantoras, eternamente dentro dos fonogramas, e de como ficava admirado pelo mistério daquilo acontecer: o brilho da negra esfera no prato, o verde musgo da estampa Odeon, a agulha sobre os sulcos e a voz de Anísio Silva entrando na sala para meu pai dançar com minha mãe. Naquele arrazoado, beirando pieguice, nem falei das capas, principalmente desta do Anísio, 1959, com ele, moço e muito bonito, de colete, exibindo um bigode David Niven, posando com o queixo apoiado entre o indicador e o polegar. Sei que foi bem aí da música me apanhar para sempre e eu não tinha seis anos, tinha cinco.
Em fevereiro deste ano, quando recebi o CD recém vindo da fábrica, replicou aquele estremecimento e senti que nada daquele espanto havia secado. Mesmo que hoje os discos sejam engolidos pelo player ou nem mais existam como mídia física, para mim sempre haverá este mistério dos cantores e cantoras, sem cronos, num suporte qualquer, que, num zás, poderão preencher com suas canções uma pequena sala, a web planetária ou o ego/fone dum Ipod. Então, ao anunciar este novo trabalho, aos 56 anos, aquele menino pasmo emerge e eu consinto. Não poderia recusar este encantamento do qual faço parte e que justifica os meus quase 30 anos de função."

Da concepção:

"Neste CD “Lua Caiada” busquei uma unidade que quase sempre, por paixão e por desatento, preteri. Nos discos passados, as músicas que eu selecionava na hora de gravar, às vezes, eram as que estavam mais próximas e daí, as mais “púberes” ganhavam pelo viço. Não importando o gênero, elas se misturavam com as que estavam na espera ou mesmo com as dispersas no tempo. Isto deixou alguns discos, principalmente aqueles que foram registros de intervalos longos sem gravar, como um punhado de balas sortidas e, mesmo sendo essas e esses a minha cara, a chamada “unidade estética” residia apenas aí. A “uniformidade” aguardada, (in)conscientemente subestimada, ia pro brejo. Por sorte, desta vez, não foi aflitiva a decisão de buscar uma unidade, mesmo achando que sentiria alguma culpa por ser um desnaturado e deixar “de fora” uma canção. Mesmo esta sendo díspar. O que veio a calhar foi das canções eleitas não serem primas distantes. Penso que cheguei há dois passos da tal coesão."

Dos arranjos:

"Nos meus discos anteriores, os arranjos das músicas eu deixava para fazer no estúdio com o auxílio dos instrumentistas que já me acompanhavam nos shows. Mostrava para eles as canções e também uma meia dúzia de frases e ideias musicais que seriam utilizadas ou não. O restante, só era concebido na hora de gravar. Muitas vezes, os resultados foram surpreendentes. Noutras, a imagens propostas se apartavam um pouco das originais. Mesmo assim, eu gostava disso, dessa coisa a partir da contingência, do momento parindo e as gravações sendo feitas de modo “take” ao vivo. As canções ficavam “quentes”, com uma pegada de grupo, de banda e não de simplesmente músicos acompanhantes arregimentados para tal. Tive sempre a sorte de contar com grandes músicos nestas ocasiões. Generosos e amigos, com eles a coisa sempre fluiu com proveito e muito aprendi.
Desta vez, por pouco que não encaro um receio do qual eu sempre ladeava. Era o de contratar um arranjador que fizesse a carpintaria das canções. Um embaraço me batia, pois a empatia ou a afinidade com o arranjador teria que ser naturalmente construída. Senão, ao encomendar os arranjos, o resultado poderia soar remoto. Ilustro a sestrosa coisa. É que quando eu escutava algum disco, por exemplo, de compositor/cantor, (e, se um destes produzidos com arranjos encomendados) observava também que, não poucos, soavam dessemelhantes à obra autoral do artista. Arranjadores e compositores são casamentos raros. Temia por isso e como tempo drenava rápido demais, abandonei a idéia. No próximo, vou encarar. A figura dos arranjadores na MPB é basilar.
Decidi, então, eu mesmo botar a mão na massa. Sendo o projeto financiado pela Petrobras, consegui realizar a pré-produção do disco. Começou no home estúdio do músico Mario Carvalho. Experimentamos algumas levadas, timbres e gravamos demos. Depois, passei a compor as frases das introduções, das passagens e dos contracantos. Assim fiz para todas as canções. A última etapa, antes de gravar, foi a dos ensaios com a banda de base.
Eu estudei violão clássico, lá pelos anos 70. Então lia e escrevia música. Como passei logo a compor música popular, acabei abandonando, infelizmente, a escrita e a leitura musical por dolo e ócio. “Deslembrado”, pedi um grande favor ao Pedrinho Franco. Ele estudava perto da minha antiga casa, aqui em Porto Alegre. De tarde, depois da aula, ele ia para lá. Lápis, borracha e caderno de pentagrama na mesa da sala, uma jarra de suco de uva para ele, um bule de café para mim. Houve uns três encontros com ele colocando na pauta o que eu lhe solfejava, assobiava ou ditava. Acurado, ele pegava o violão e tocava pra eu saber se era aquilo mesmo. E era. E foi aquilo tudo parar no Cd. Pedrinho ainda colaborou nas cifras e como copista.
Uma experiência doida de linda é essa, agora, com o disco recém parido, de escutar exatamente o que eu havia imaginado. Obrigado, Pedrinho. Prometo estudar."

Das letras:

"É esfolar a imprecisão quando me arrisco a responder uma pergunta recorrente aos compositores: primeiro a letra, a música depois ou vem “tudo/junto/incluído/de uma vez”? Essa coisa doida é toda doida coisa. Depois de 30 anos fazendo isso, tudo está entranhado que se torna difícil aclarar. Bueno. Um dia é uma palavra que acende a música. Noutro, uma fortuita melodia me aborda e cobra um verso. Noutro ainda, apenas um acorde faz borbotar a hemorragia, quase sempre depois que levo um soco no baço ou da vida, da esquina, da cidade, do país etc... Mas rola também o deserto brabo e daí... nasce nada. E isso pode perdurar ao medo.Existem canções que se querem urgentes, expeditas e se admitem logo independentes do compositor. Tem as de encomendas, com seus prazos inspiradores ou sufocantes. Posso ir mais além, para dizer que há canções que não se deixam parir assim tão céleres. Solicitam-se caprichosas por maturação e algum dengo. Outras são noviças, tenras, e desta vez, é o compositor que não quer, ou não admite, o desmame. É para ficar o maior tempo possível perto delas, pois sabe, se prontas, elas criam asas e se alçam. Gosto de todas estas formas. Até daquelas, e são muitas, que se sabe que irão parar na amnésia.
O que sucedeu com as canções que vinha selecionando para este Cd foi das músicas se apresentarem bem antes das letras. Um ou outro verso, quando vinha, vinha débil ou fraturado. Às vezes, um achava de emanar, mas no máximo assegurava o assunto da canção. Muitas das palavras, como ferramentas, suportavam apenas o ônus para que eu pudesse memorizar a melodia ou um acorde específico e só. E cada vez mais as harmonias chegavam sem as letras. Trabalhava a música, pensava no arranjo, nos instrumentos, ensaiava com os músicos, mas e as letras? Não dei muita bola. Na hora vai rolar, me lograva.
O engraçado, ou melhor, a ironia, é que eu me achava mais apto em fazer textos e a música, em mim, sempre foi e será produzida instintivamente. Minha relação com o fluxo do pensamento escrito me acompanha faz tempo. E este, bem na hora do trabalho, se mandou lá para não sei donde e sem aviso prévio.
E chegou o e-mail com a agenda do estúdio: dia tal vão começa as gravações das bases. Provoquei, sem rubor algum, cenas hilárias. Os músicos riam. Eu cantando a “voz guia” das canções e estas abarrotadas de palavras inventadas na hora, versos excêntricos e fonemas sem pé nem cabeça. E foi assim em quase todas as gravações e nada das letras, uma doidaria.
Eu passava os dias e as noites num misto de estóico e prazeroso empenho na garimpagem de palavras, de fabulações, de emoções recônditas ou ainda frescas. O pânico era de que a datas do cronograma do projeto já acenavam com um sinal rubro. Minha acuidade vadia na escolha dos versos e das palavras fazia o tempo escoar-se
rápido por demais. Como compositor, continuamente desguiei da afetação do rigor que gessa. Entendo que rigorosidade é uma falsa senhora e o rigorista esconde um tenso narciso. A arte do compositor popular é de outra beira e, para continuar no chiste, a perfeição é uma meta defendida pelo Gilberto Gil seus outros grandes pares.

As parcerias, com Bebeto Alves e Antônio Villeroy, foram mais fáceis. Um ano antes de eu começar a gravar, Bebeto achou rumo certo para “Teu Segredo”. Para ele mandei a melodia toda, alguns versos e vários pedaços e cacos de palavras. Ele, bondoso, montou a carpintaria. Ufa! Com Antonio, aconteceu de ele me mandar um e-mail com uma estrofe de cenas cortantes e insólitas e destas desvelei, aos poucos, a valsa “Àgora”. No entusiasmo, escrevi o restante da letra.
Mas e as outras? O samba ”Noite Vazou Encantada”, mesmo inconclusa, eu a experimentava nos shows. Dizia para as pessoas que ainda não estava pronta e pedia, mesmo assim, para elas cantarem a primeira parte. A segunda parte - prometia - vocês vão escutar no disco. Fiquei com medo desta promessa. Eu não alcançava terminá-la. A inspiração, às vezes, é um ferrolho rude, pensei. Daí que passei a fabular histórias e mais estórias para cada uma das canções. O garimpo era toda a casa com livros espalhados pelo chão, pelas mesas, pelos cantos, banheiro, cozinha, revistas, jornais, anotações, rabiscos, papéis aos nacos e mais os formigueiros dos dicionários. Uma formidável entropia a meu dispor, para omitir o termo bagunça. O computador, só ao final utilizei: recorta e cola, recorta e cola...
Para a desordem criativa, fiz uma pasta de cartolina para cada música, um artifício que inventei nos anos 70. 14 pastas. O título e o tom. Nestas, ia jogando tudo que eu via referente a cada canção. Pescava uma palavra num livro, num jornal, num texto alhures, num papo, num blog, na TV, no rádio, ia tomando nota e tudo parava nas pastas. Elas engordando e o calendário pegando fogo. Ainda havia um troço que me persegue nestas quadras, como o gosto da palavra, o malte da palavra, da carne/lascívia do fonema, da graxa da sílaba dita ou cantada e a plena fruição no encalço da intangível prosódia perfeita. Em febre, vejo, na folhinha, o dia da mixagem chegando. E as letras? Disse, para espanto do Agnaldo Paz, técnico de gravação: - vou mixar o disco sem as letras prontas. Depois coloco a voz sobre a mix finalizada. Ganhei mais duas semanas com isso. Mixava durante a madrugada e passava o dia no garimpo. Não havia padecimento: era inteiro de deleite. Claro que, pelo prazo do projeto estar se esgotando, eu sofria uns solavancos de culpa e de expiação.
Uns dois dias antes de gravar a voz final, enfim, havia terminado a coisa toda. Vou mentir se não disser do meu lápis que trabalhou até o derradeiro instante.
O resultado foi que as canções parecem feitas ontem. E foram."

domingo, 11 de abril de 2010

HOMENAGEM AO DIA NACIONAL DO CHORO


O Clube do Choro de Porto Alegre retorna ao Instituto Cultural após o grande sucesso do espetáculo de comemoração dos seus 20 Anos, realizado em novembro passado. Agora, a apresentação é em Homenagem ao Dia Nacional do Choro e será realizada na terça-feira, dia 20 de abril, às 20 horas, no Auditório do Cultural (Riachuelo 1253).

Este espetáculo deverá reunir os músicos integrantes do Clube do Choro (Arthur Sampaio no violão, Enio Casanova no bandolim e cavaquinho, Luiz Bastos Cebolinha no cavaquinho, André Rocha no pandeiro, Runi Correa no surdo, Paulo Platt na caixeta e Myriam Sampaio na voz), ao lado de Rafael Lima no saxofone, como participação especial.

O Dia Nacional do Choro é comemorado em 23 de abril, em homenagem à data de nascimento de Pixinguinha, uma das figuras exponenciais da música popular brasileira, e em especial do choro.

Pixinguinha
Alfredo da Rocha Vianna Júnior nasceu em 23 de abril de 1887. Cedo dedicou-se à música e deixou um legado de inúmeros clássicos, arranjos e interpretações magistrais, como flautista e saxofonista. Carinhoso, Lamento, Rosa, 1 x 0, Ainda Me Recordo, Proezas de Solon, Naquele Tempo, Vou Vivendo, Abraçando Jacaré, Os Oito Batutas, Sofres Porque Queres, Fala Baixinho, Ingênuo, estão entre algumas de suas principais composições.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Saiu a lista definitiva dos indicados ao Troféu Açorianos de Música em 2010


Saiu na terça-feira, dia 06 de abril, a lista completa e definitiva das indicações ao Troféu Açorianos de Música 2010, relativo aos trabalhos musicais produzidos no Rio Grande do Sul durante o ano de 2009.

Mais uma vez, a Odara Produções assina vários dos projetos indicados e, com muita alegria, comemora a indicação de seu diretor Márcio Gobatto como Melhor Produtor Executivo:

O Projeto Cidade Baixa, de Fausto Prado e Caetano Silveira, levou seis indicações: Melhor espetáculo, Melhor Disco de MPB, Melhor arranjador para Fausto Prado, Melhor Projeto Gráfico para Diego e Eduardo Antunes, Melhor intérprete para Alex Alano, Ana Krüger e Andrea Cavalheiro, além de Melhor Produtor Executivo para Márcio Gobatto.

O Projeto Milongaço, de Maurício Marques, teve 5 indicações: Melhor Disco na Categoria Instrumental, Melhor arranjador, Instrumentista e compositor para Maurício Marques, além de Melhor Produtor Executivo para Márcio Gobatto.

E o Projeto Tridimensional, de Gelson Oliveira, teve 3 indicações: Melhor compositor em MPB para Gelson Oliveira, Melhor Instrumentista em MPB para Paulinho Fagundes, além de Melhor Produtor Executivo para Márcio Gobatto.

A entrega do Prêmio Açorianos acontece no dia 28 de abril, às 20:30 horas, no Theatro São Pedro e a lista completa dos indicados pode ser conferida na página da SMC: www.portoalegre.rs.gov.br/cultura.

Parabéns a todos os indicados !

terça-feira, 6 de abril de 2010

Programa do Samba e do Choro em horário novo


O Programa do Samba e do Choro está com novos horários na programação 2010 da Rádio Web Buzina do Gasômetro.

Agora o Programa apresentado por Márcio Gobatto e produzido pela Odara Produções pode ser conferido nas terças e sextas-feiras, sempre em dois horários: às 13 e às 22horas.

O endereço da Rádio é o www.radiobuzina.com.br

sábado, 3 de abril de 2010

O Choro do Rio Grande na Livraria Cultura


Os Músicos Mathias Pinto - Violão 7 cordas, Guilherme Sanches - Pandeiro e Vinicius Ferrão - Bandolim irão se reunir na próxima sexta-feira, dia 9, para apresentar o espetáculo "CHORO DO RIO GRANDE", na Livraria Cultura (Bourbon Country - Porto Alegre), a partir das 19 horas. A entrada é 1kg de alimento não perecível.

O repertório apresenta a obra de compositores gaúchos de choro, como Octávio Dutra, Avendano Jr, Radamés Gnattali e Plauto Cruz, sem deixar de lado a produção de compositores atuais que seguem mantendo a produção contínua desse gênero musical genuinamente brasileiro, como Luís Barcelos que nasceu em Rio Grande e hoje vem se destacando no cenário musical do Rio de Janeiro.

A iniciativa destes 3 jovens músicos surgiu a partir da sua participação nas Oficinas de Choro do Santander Cultural, ministrada pelo prof. Luiz Machado. Entre outros projetos, eles também são integrantes do Espetáculo "O Maestro, o Malandro e o Poeta - Tom, Chico e Vinicius", apresentado pelas bandas: Carne de Panela, Tribo Brasil e Roda Viva.